Leia abaixo a reportagem da Edição do Jornal Extra na internet:
Crianças sofrem com doenças à margem do Rio Sarapuí
Elas já nascem à margem: à margem do rio, da saúde e da vida. São as maiores vítimas da vingança do Rio Sarapuí. Inocentes, brincam ao lado do inimigo, entram em suas águas contaminadas, recebendo de volta todo o veneno que vem sendo há anos despejado nos seus 36 quilômetros de extensão. Por meio desse contato, as crianças conhecem, logo cedo, as cólicas das gastroenterites, o desconforto dos vômitos, os calafrios das febres, as coceiras das doenças de pele e os prejuízos nutricionais das verminoses. Na escola, isso se reflete na dificuldade de aprender.
Em seus 2 anos e 9 meses de vida, morando diante do rio, na Chatuba, Mayara adquiriu otite crônica, já foi internada com celulite na perna — uma infecção grave na pele, que pode evoluir para infecção generalizada — e teve diarreia crônica. A menina caiu nas águas poluídas do Sarapuí aos 6 meses, quando engatinhava em suas margens. Desde então, chora quase todas as noites, com dores no ouvido.
Injeções de penicilina
— Dou remédio contra dor e antibiótico. Aliás, Mayara está sempre tomando antibiótico. A última vez foi para curar a diarreia crônica — contou a mãe, Daniele Pinto, de 32 anos, que teve a casa destruída na enchente da virada do ano, e, depois de dez anos com o Sarapuí batendo na sua porta à cada chuva mais forte, está morando a duas quadras do inimigo.
As injeções de penicilina fazem parte da rotina das crianças que vivem à beira do Sarapuí, numa tentativa ínfima de conter a revanche do rio.
Ivamar Lourenço, de 40 anos, não tem conhecimentos de medicina, mas, após 17 anos vivendo próximo do rio, em Catiri, já percebeu que as injeções de benzetacil aplicadas em sua filha Stefani Vitória, de 6 anos, são apenas um paliativo contra as bolhinhas de água que insistem em brotar na perna da menina.
— Melhora um tempinho, mas volta. Ela se coça e tem vergonha disso — diz Ivamar.
Infecções que se repetem
Segundo o pediatra infectologista Edimilson Migowski, professor da UFRJ que examinou Stefani e Mayara, o contato com a água suja do rio faz com que as meninas estejam sempre se reinfectando:
— É um problema relacionado ao ambiente em que elas vivem. E o uso recorrente de antibióticos cria condições para o aparecimento de bactérias resistentes. Há o risco de surgirem doenças mais difíceis de serem curadas.
Nos últimos três meses, no entanto, Stefani tem acompanhado a melhora das lesões. A família saiu da beira do rio.
— Sei que vou melhorar! — disse a menina.
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